30 de
dezembro de 2018
Agora, aguenta!
O Brasil se transformou, nos dias de
hoje, em um elaborado projeto de controle da mente humana.
Por meio desse controle, os poderes econômicos que governam
a sociedade almejam criar cidadãos dóceis que ofereçam pouca
resistência à imposição de medidas draconianas de retirada
de direitos adquiridos, que reduzam a faculdade de
julgamento e de reflexão e impeçam uma atitude que leve a
uma decisão baseada no livre arbítrio. Como sabemos, se de um lado a
sociedade de massas proporcionou ao sistema capitalista
produtor de mercadorias mão de obra relativamente barata
capaz de produzir uma grande margem de lucro, de outra parte
inúmeras resistências à exploração contínua do trabalho mal
remunerado geraram rebeliões e insurreições populares que
instabilizaram o sistema. Com a automação, se tornou mais
fácil descartar uma parcela indesejável de trabalhadores e
subjugar com maior facilidade a força de trabalho ainda
necessária, utilizando para tanto o imenso exército de
reserva dos desempregados. Como somente isto ainda não foi o
suficiente e uma imensa massa humana continuava a se
amontoar nas favelas das grandes cidades, especialmente nas
megalópoles do Terceiro Mundo, tornou-se necessário conceber
outros projetos de redução dessa parte do lixo humano que
constitui hoje a mão de obra não qualificada, desnecessária
ao modelo capitalista neoliberal.
No início do novo milênio, as redes
sociais criadas pelos órgãos de inteligência dos Estados
Unidos a partir das novas tecnologias digitais – e que se
converteram num eficiente instrumento de disseminação de
informações amplamente usadas pelos bilhões de usuários dos
celulares − se tornaram uma fonte de notícias
progressivamente mais falsas e mentirosas que, pela
credibilidade que conquistaram, terminaram por criar uma
modalidade de realidade paralela na vida de milhões de
pessoas. Se já vínhamos progressivamente
penetrando em uma espécie de zona crepuscular onde se torna
cada vez mais difícil distinguir entre o bom e o mau, o
certo e o errado, o justo e o injusto, à medida que os
parâmetros para o nosso julgamento passaram a ser impostos
pelos veículos de comunicação de massa, redes sociais e
instituições religiosas fundamentalistas, cidadãos de
diferentes países como os Estados Unidos, França, Itália e
Brasil foram convertidos simultaneamente em espectadores e
protagonistas de um extraordinário acontecimento de
estelionato político ao serem levados, por meio de
sofisticadas técnicas de propaganda, a optar para o cargo de
Presidente da República por discutíveis personagens da sua
história política. No caso brasileiro, foi ainda pior: mais
de 57 milhões de brasileiros escolheram um defensor da
tortura, racista, misógino e entreguista. Na verdade, não apenas isto: como
parte de seu séquito também vieram políticos desonestos com
seus serviçais igualmente abjetos, antigos cães de guerra do
regime militar extinto há 33 anos, fascistas de ontem e de
hoje como aqueles de derrubam placas que homenageiam mortos
e desrespeitam professores, entreguistas a serviços de seus
patrões norte-americanos, juizecos de província com ambições
a se converterem em poderosos
Torquemadas,
aventureiros sem nenhum escrúpulo e até mesmo um decadente
ator pornô em fim de carreira ou já aposentado. Os muitos milhões que votaram nestes
quidams esperam
que – como seus representantes e agora muito bem remunerados
pelo Estado – tenham a capacidade de oferecer ao cidadão as
soluções para suas necessidades de emprego, assistência
médica, educação, transporte, moradia, segurança e bem
estar. Como já ocorreu em outras ocasiões
em nossa história, verificarão cedo ou tarde que foram
enganados ou se deixaram enganar, porque aqueles que
sufragaram nas urnas não estarão dispostos a defender os que
os elegeram mas, sim, a bater continência para os seus
verdadeiros senhores: os mesquinhos interesses pessoais e os
patrões de além-mar. A ilustração do artista plástico
Rodchenko antecipa um cenário que talvez venha a se tornar
familiar aos nossos olhos.
Que o ano de 2019 não represente um retorno ao
1984 de
Orwell ou ao nosso infausto 1964.
Sérvulo Siqueira
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