30 de dezembro de 2018

 

Agora, aguenta!

O Brasil se transformou, nos dias de hoje, em um elaborado projeto de controle da mente humana. Por meio desse controle, os poderes econômicos que governam a sociedade almejam criar cidadãos dóceis que ofereçam pouca resistência à imposição de medidas draconianas de retirada de direitos adquiridos, que reduzam a faculdade de julgamento e de reflexão e impeçam uma atitude que leve a uma decisão baseada no livre arbítrio.

Como sabemos, se de um lado a sociedade de massas proporcionou ao sistema capitalista produtor de mercadorias mão de obra relativamente barata capaz de produzir uma grande margem de lucro, de outra parte inúmeras resistências à exploração contínua do trabalho mal remunerado geraram rebeliões e insurreições populares que instabilizaram o sistema.

Com a automação, se tornou mais fácil descartar uma parcela indesejável de trabalhadores e subjugar com maior facilidade a força de trabalho ainda necessária, utilizando para tanto o imenso exército de reserva dos desempregados. Como somente isto ainda não foi o suficiente e uma imensa massa humana continuava a se amontoar nas favelas das grandes cidades, especialmente nas megalópoles do Terceiro Mundo, tornou-se necessário conceber outros projetos de redução dessa parte do lixo humano que constitui hoje a mão de obra não qualificada, desnecessária ao modelo capitalista neoliberal.

As pandemias produzidas artificialmente em laboratórios como a vaca louca, a gripe aviária, a zika, a chikungunha e o HIV, assim como as seguidas guerras  deflagradas principalmente pelos Estados Unidos, contribuíram também para diminuir a população mundial mas no ano de 2000 verificou-se que não tinha sido possível alcançar a redução dos seres humanos em 500 milhões de pessoas que havia sido proposta pela Fundação Rockfeller, algumas décadas antes. Por outro lado, a intensificação do uso de agrotóxicos, ou pesticidas para a lavoura, e do cultivo da agricultura com sementes transgênicas – cujos efeitos aparecem mais no médio e longo prazo – ainda não produziram os resultados letais desejados.

Artistas visionários do século 20 – como Alexander Rodchenko, George Orwell, Aldous Huxley e Rod Serling, entre muitos outros − já haviam antecipado que a evolução da sociedade tecnológica de massa levaria a uma crescente manipulação dos corações e mentes do homem, a ser exercido pelo Estado por intermédios dos veículos de comunicação de massa.

Ao longo de todo o século passado, estes e outros artistas e pensadores foram capazes de vislumbrar o crescente desejo de controle do sistema de poder tanto no sistema capitalista do Ocidente quanto no modelo do socialismo real da União Soviética. Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley; 1984, de George Orwell e a série Além da Imaginação (The Twilight Zone), de Rod Serling, são algumas obras que foram interpretadas como a antecipação de um futuro carregado de tonalidades sombrias.
Alexander Rodchenko, As Guerras do Futuro, 1930    

No início do novo milênio, as redes sociais criadas pelos órgãos de inteligência dos Estados Unidos a partir das novas tecnologias digitais – e que se converteram num eficiente instrumento de disseminação de informações amplamente usadas pelos bilhões de usuários dos celulares − se tornaram uma fonte de notícias progressivamente mais falsas e mentirosas que, pela credibilidade que conquistaram, terminaram por criar uma modalidade de realidade paralela na vida de milhões de pessoas.

Se já vínhamos progressivamente penetrando em uma espécie de zona crepuscular onde se torna cada vez mais difícil distinguir entre o bom e o mau, o certo e o errado, o justo e o injusto, à medida que os parâmetros para o nosso julgamento passaram a ser impostos pelos veículos de comunicação de massa, redes sociais e instituições religiosas fundamentalistas, cidadãos de diferentes países como os Estados Unidos, França, Itália e Brasil foram convertidos simultaneamente em espectadores e protagonistas de um extraordinário acontecimento de estelionato político ao serem levados, por meio de sofisticadas técnicas de propaganda, a optar para o cargo de Presidente da República por discutíveis personagens da sua história política. No caso brasileiro, foi ainda pior: mais de 57 milhões de brasileiros escolheram um defensor da tortura, racista, misógino e entreguista.

Na verdade, não apenas isto: como parte de seu séquito também vieram políticos desonestos com seus serviçais igualmente abjetos, antigos cães de guerra do regime militar extinto há 33 anos, fascistas de ontem e de hoje como aqueles de derrubam placas que homenageiam mortos e desrespeitam professores, entreguistas a serviços de seus patrões norte-americanos, juizecos de província com ambições a se converterem em poderosos Torquemadas, aventureiros sem nenhum escrúpulo e até mesmo um decadente ator pornô em fim de carreira ou já aposentado.

Os muitos milhões que votaram nestes quidams esperam que – como seus representantes e agora muito bem remunerados pelo Estado – tenham a capacidade de oferecer ao cidadão as soluções para suas necessidades de emprego, assistência médica, educação, transporte, moradia, segurança e bem estar.

Como já ocorreu em outras ocasiões em nossa história, verificarão cedo ou tarde que foram enganados ou se deixaram enganar, porque aqueles que sufragaram nas urnas não estarão dispostos a defender os que os elegeram mas, sim, a bater continência para os seus verdadeiros senhores: os mesquinhos interesses pessoais e os patrões de além-mar.

A ilustração do artista plástico Rodchenko antecipa um cenário que talvez venha a se tornar familiar aos nossos olhos.

Que o ano de 2019 não represente um retorno ao 1984 de Orwell ou ao nosso infausto 1964.

 

Sérvulo Siqueira