19 de novembro
de 2010
Nuvens sombrias se movimentam sobre o horizonte europeu, ameaçando a
economia mundial. O poder destrutivo do sistema financeiro, cujo efeito
de contaminação se alastra, parece ser um monstro gerado pelo
neoliberalismo que como nas superproduções de Hollywood ressurge sempre
no momento em que é eliminado.
Desta vez é a Irlanda – há pouco mais de 15 anos apresentada como o
paraíso onde a maior parte da indústria farmacêutica e de informática se
instalou – hoje transformada no novo cenário da crise econômica e
financeira mundial.
Para
a Europa, o espectro ainda mais assustador é que – após as insolvências
da Islândia e da Grécia, a falência bancária do Eire sinaliza crises
futuras para outros países do continente e uma possível rachadura no
monolitismo da Comunidade Européia, ancorado na aparente fortaleza do
euro. O grande sonho de uma unidade política que respeite as
diversidades étnicas e culturais corre o risco de desabar se países como
a Irlanda, Portugal e outros abandonarem a moeda única.
É
provável que a curto prazo isto não aconteça mas as consequências para
os países que aceitarem perder a soberania com o objetivo de preservar a
ortodoxia fiscal europeia podem ser as mais devastadoras em termos
sociais e econômicos. Assim como as doenças do capitalismo são velhas,
igualmente obsoletas parecem ser as terapias. De um lado, reduções de
salários, dispensa de empregados, cortes de postos de trabalho,
eliminações de benefícios sociais e – finalmente – a recessão econômica
ou, o que é ainda pior, a estagflação, recessão com inflação. As
terapias parecem corresponder a essas doenças recidivas e incidem quase
sempre sobre os aspectos monetários e fiscais desses tremendos
desequilíbrios: menor ação do Estado com a restrição aos investimentos
sociais, controle da moeda e do consumo, câmbio flutuante e – por fim –
as sinistras reformas liberalizantes, além de um sem número de ações,
todas elas visando reforçar o poder do sistema financeiro mundial
controlado pelos bancos.
O
último capítulo deste receituário da morte parece ter sido a
recém-instituída guerra das moedas desatada pela desova de 600 bilhões
do chamado papel pintado norte-americano, promovida pelo Federal Reserve
Bank no mercado.
Ao
mesmo tempo, em meio a todo esse imbróglio criado pelos países mais
poderosos do Ocidente, abre-se uma porta para as nações que faziam parte
do antigo Terceiro Mundo, hoje em grande parte integradas ao grupo dos
Países Não Alinhados: buscar um caminho próprio, romper com os
malfadados organismos multilaterais como o Fundo Monetário
Internacional, o Banco Mundial e outros, encontrar um processo de
desenvolvimento com maior justiça social, privilegiar políticas públicas
de distribuição de renda e – se possível – transformar o seu injusto
sistema econômico.
Talvez esteja chegando a hora em que todos esses povos terão a
oportunidade de reencontrar a sua própria história, em muitos casos
brutalmente interrompida por golpes de Estado, guerras civis,
assassinatos políticos, intervenções militares estrangeiras, etc.
Em
praticamente todos esses episódios, o poder imperial americano esteve
por trás de flagrantes violações dos direitos humanos e
constitucionais.
Quem
sabe agora, envolvidos em duas grandes guerras de conquista e
contaminados por uma crise econômica e social sem precedentes, eles nos
deixem em paz, ao menos por um momento!
Sérvulo Siqueira |