Curso de cinema produz filme experimental: Vinte minutos coloridos por personagens reais

 

A Associação deverá receber ainda este mês o curta metragem "Praça XV", documentário em Super-8 realizado por funcionários do Banco como trabalho prático durante o curso de cinema que o Centro Cultural promoveu no primeiro semestre deste ano.

Em cores, com cerca de 20 minutos de duração, a fita reúne as melhores tomadas obtidas pelos participantes do curso na Praça XV, em incursões feitas no horário do almoço e aos sábados e domingos, durante cerca de dois meses. A trilha sonora inclui músicas do LP "Confusão Urbana e Rural", de Paulo Moura.

O Curso

 

Iniciado em abril sob a coordenação de Sérvulo Siqueira, o curso foi realizado inicialmente no Auditório Arino Ramos Ferreira e constou de uma parte teórica sobre história do cinema - com distribuição de apostilas e exibição das obras dos precursores do cinema e de clássicos - e de uma parte prática; compreendendo filmagens, em caráter de experiência, de cenas na Praça XV, para a montagem de um documentário, sob a supervisão do coordenador do curso.

Participaram cerca de 50 pessoas — a maior parte associados — divididas em duas turmas, uma de manhã e outra à noite. Entre os alunos havia cineastas amadores de super-8, fotógrafos, desenhistas, gente com alguma informação técnica sobre o assunto e também cinéfilos, mais interessados na apresentação das obras do que no aprendizado prático.

Entre os filmes exibidos na parte internacional destacaram-se Nosferatu, de Murnau (o primeiro Conde Drácula do cinema); Le Cinematographe Lumière, com a apresentação das primeiras máquinas de projeção dos Irmãos Lumière e de cenas feitas por eles em 1894; muito importantes por seu aspecto histórico; Intolerância, de David Griffith; Une Partie de Campagne, de Jean Renoir (filho do impressionista Renoir), além de Le Grand Meliès, retrospectiva da obra de Meliès, o primeiro cineasta do mundo.

Dos filmes nacionais apresentados impressionaram mais O Descobrimento do Brasil, longa metragem de Humberto Mauro feito em 1937; Adhemar Gonzaga, que mostra a influência desse cineasta na criação de uma consciência cinematográfica e na experiência de implantação de uma infraestrutura industrial no Brasil: O Cinema Falado, que mostrou o início do cinema sonoro brasileiro; Curso Prático de Cinema, documentário sobre um curso de cinema promovido em 1972 pelo INC; Vera Cruz, a fábrica de desilusões; e Panorama do Cinema Brasileiro. Os participantes do curso puderam ainda assistir no cineclube AFBNDE os filmes São Bernardo, de Leon Hirzman; A Noite do Espantalho, de Sérgio Ricardo; O Amuleto de Ogum, de Nelson Pereira dos Santos; e Os Inconfidentes, de Joaquim Pedro de Andrade. A maior parte dos filmes nacionais foi obtida no Instituto Nacional do Cinema, enquanto o restante — alguns cedidos e outros alugados — foi conseguido na Maison de France, no Instituto Cultural Brasil — Alemanha, na Embaixada Americana, no Museu de Arte Moderna e na filmoteca da TV Globo.

Com relação ao material impresso os alunos do curso receberam a tradução resumida do livro Le Cinéma D'Amateur, de Georges Regnier; Os Planos, de Henri Agel; Setenta Anos de Cinema Brasileiro, de Adhemar Gonzaga e Salles Gomes, outras apostilas, um trecho do roteiro que Glauber Rocha utilizou para filmar Deus e o Diabo na Terra do Sol e um pequeno dicionário de termos técnicos. Os autores franceses tiveram que ser traduzidos para o português pelo Centro Cultural da Associação.

 

O Filme

 

Programado inicialmente para três meses, o curso teve sua duração aumentada em mais algum tempo devido à realização do filme, cujas tomadas se estenderam durante praticamente todo o mês de julho. Esse fator, aliado à interdição do auditório para obras — o que obrigou o curso a se transferir para uma sala cedida pelo DEPES na Avenida Presidente Vargas -, fez com que o curso fosse concluído com poucos participantes.

A escolha do assunto a ser filmado foi também objeto de um demorado brain-storm: da sugestão de um filme documentário sobre o Botafogo, atualmente um time de futebol sem campo para treinar (foi vendido para o pagamento de dívidas), surgiu a idéia de fazer um documentário sobre um time de futebol suburbano e também a de documentar, sob os mais variados aspectos, o que seria o Estádio do Maracanã durante uma decisão de campeonato. Todas essas opções foram abandonadas diante do tema Praça XV, que apresentava maiores facilidades de execução, por sua proximidade e por ser um campo aberto diariamente à pesquisa cinematográfica.

As filmagens começaram após um planejamento que dividiu o assunto em quatro tópicos (arquitetura, lazer, tipos, profissões) utilizando equipes compostas por um fotógrafo, um operador de som com um gravador e o cinegrafista. Houve revezamento nas funções, já que o interesse maior girava em torno de empunhar a câmera de Super-8 — muitos pela primeira vez — e, depois de escolhido o assunto, focalizar, segurar com firmeza, e disparar.

Em número de cinco, as equipes foram formadas a partir de alunos que já possuíam câmeras, para que pudessem transmitir aos outros sua experiência de manuseio. Foram adquiridos 30 cassetes de três minutos (50 pés) cada um, "utilizados mais de 60 minutos de filme e aproveitados cerca de 20 minutos, que constituem o Praça XV". Foram gravados depoimentos de vários dos personagens (a baiana, o carregador de malas etc, mas as dificuldades posteriores de sincronização fala/imagem — que encareceriam o filme — e de consenso quanto à sonoplastia levaram o coordenador do curso a optar pela montagem de uma trilha sonora com músicas do saxofonista Paulo Moura e poemas, sem necessidade de uma sincronização rigorosa com a imagem. O filme foi todo montado em casa, com a ajuda de um cineasta amador, funcionário do Banco, que possui todo o equipamento. Os letreiros são de autoria de outro funcionário, desenhista do GEA.

 

Matéria publicada na revista Vínculo, BNDE, 1976