29 de setembro de 2018

 

O eleitor brasileiro não deve se deixar enganar

Não tema o inimigo porque o seu inimigo somente pode tirar a sua vida. É muito melhor que você tema os meios de comunicação porque eles podem roubar a sua HONRA. Este poder horrível, a opinião pública de uma nação, é criado na América por uma horda de simplórios ignorantes e autocomplacentes que não são capazes de cavar um buraco ou fazer um sapato e buscaram o jornalismo para chegar à casa do povo mais pobre. (Mark Twain)

 

Se as pesquisas eleitorais – que apontam a chegada ao segundo turno de dois candidatos com programas inconciliáveis − estiverem certas, estamos à beira de umas das maiores crises institucionais de toda a história do Brasil. Embora seus programas pareçam radicalmente opostos, os partidos envolvidos na disputa apresentam alguns pontos em comum: um deles é que– na hipótese de que seus projetos sejam postos em prática − estes poderão levar o país, por razões diferentes, a uma convulsão de amplas proporções.

Se de um lado o programa do dinossauro fascista – pela truculência que apresenta – deve provocar um clima de terror no país e pode suscitar reações de igual monta, o candidato do Partido dos Trabalhadores terá poucas condições de governabilidade uma vez o persistente trabalho dos meios de comunicação e os erros que seu partido cometeu nos quase 14 anos em que esteve no poder geraram um sentimento muito negativo em relação ao seu retorno.

Ao contrário da polarização entre PSDB e PT, que se observou nos mais de 20 anos que decorreram desde a chamada redemocratização, temos agora a figura de um capitão do Exército que foi muito bem sucedido em capitalizar em seu favor um latente sentimento contra o Partido dos Trabalhadores e tem agora a possibilidade de se tornar o próximo presidente do Brasil, uma perspectiva que parece a muitos como verdadeiramente tenebrosa.

Muito tem sido falado e escrito para explicar a ascensão de um obscuro deputado até a condição de favorito nas eleições de 7 de outubro deste ano. Entre as razões para o apoio que Bolsonaro vem recebendo podem ser arroladas o desencanto de antigos apoiadores do PT com o partido que haviam escolhido e que não cumpriu o que prometeu; o desejo de maior segurança dos cidadãos diante da violência urbana e a persistência de roubos, assaltos, sequestros que permeia a vida nas cidades; o sentimento de rancor de uma parte da população que considera não ter recebido a merecida atenção do Estado e, naturalmente, um certo viés autoritário que está integrado à nossa cultura e que é personificado exemplarmente pelo candidato do PSL.

Ao mesmo tempo, o PT deve dar explicações à nação de por que um partido – que tem como proposta a elevação do nível de consciência política do cidadão brasileiro – ainda se serve de uma prática retrógrada que se sustenta numa pregação populista destinada à erigir seu líder máximo, que se encontra preso em Curitiba, à condição de redentor messiânico da nossa sofrida nação.

Somente este argumento poderia justificar como um candidato fraco, inseguro e até titubeante em muitas circunstâncias poderia subitamente se transformar em alternativa para assumir o posto mais importante da República num momento tão dramático como o que estamos vivendo. No entanto, se os chamados militantes podem dar esta demonstração de uma fidelidade tão canina como querem muitos, os dirigentes do partido demonstram irresponsabilidade em sua decisão porque deveriam ter consciência dos riscos que a vitória de qualquer um dos lados – que parecem agora bem polarizados – comporta para a vida da nação.

Faltou grandeza política a Luís Inácio da Silva ao não abrir mão de indicar um candidato – apenas pelo desejo de manter uma liderança no campo popular que jamais voltará a alcançar – e com isto desencadear esta terrível situação de instabilidade em que o país se encontra, com o candidato fascista já anunciando que não aceitará outro resultado senão a sua própria vitória, o que de antemão cria uma atmosfera propícia à eclosão de uma revolução colorida que deverá levar a uma imensa perturbação da ordem pública e talvez a uma intervenção militar.

Se os fatos ocorridos em outros países podem servir de referência, há uma grande probabilidade do surgimento de um governo autoritário que – a pretexto de colocar ordem no país, como sempre ocorre nestas situações – poderá instaurar uma ditadura no mínimo semelhante à que perdurou no Brasil por 21 longos anos. E é bom lembrar que esta possibilidade se torna viável no momento em que o fascismo, o racismo, o neonazismo ressurgem em várias partes e chegam inclusive ao poder em diversas regiões da Europa.

No caso brasileiro, os meios de comunicação desempenharam um significativo papel demonizando a atividade política, o que levou ao discurso pseudomoralizador do mastodonte fascista que lidera as pesquisas e que no momento parece que começa a assustar até mesmo os criadores do clima de caça às bruxas que desde algum tempo vem contagiando o país, como prova a mais recente capa da revista Veja.

Por sua vez, depois de todos os erros que cometeu, das promessas não cumpridas, das alianças espúrias com o grande capital e das falcatruas em que se envolveu com políticos desonestos, o PT agora pede que o cidadão brasileiro lhe devolva o poder do qual foi apeado.

Querem então que nos disponhamos a carregar o andor do PT. Ocorre que o andor leva santinhos de pau oco– por onde correm certamente as riquezas que o partido e seus aliados surrupiaram da população – e santos de barro que não tem mais nenhuma capacidade para realizar milagres. Desejam que acreditemos que seu falso deus entronizado vai resolver os problemas do país quando sequer é capaz de salvar a si mesmo, porque está preso num cubículo, e com este objetivo fazem novas promessas que não vão cumprir.

Utilizam o mesmo expediente que os favoreceu no passado e que fez com que o governo Lula – com algumas poucas realizações realmente significativas – parecesse tão bom apenas porque vinha após o horrível período de Fernando Henrique Cardoso.

Repete-se aqui a mesma história ocorrida com o ex-presidente norte-americano Richard Nixon.

Conta-se que Nixon, já nos albores do processo Watergate e confrontado com a necessidade de encontrar um substituto para seu vice-presidente Spiro Agnew − que havia sido cassado por corrupção – depois de uma demorada pesquisa finalmente se decidiu pelo nome de Gerald Ford, um obscuro e inexpressivo deputado que jamais havia apresentado um projeto à Câmara, e quando seus assessores manifestaram grande surpresa pela escolha, explicou:

─ Vocês vão ver, quando eu não estiver mais aqui ele me fará melhor do que sou.

Hoje, o PT volta a se utilizar do mesmo ardil e se apresenta com a escolha mais aceitável diante da truculência de Bolsonaro, ou seja, de antemão já cria uma explicação para um possível fracasso.

Como se dizia antigamente, “há algo mais no ar além dos aviões de carreira” e o eleitor não deve deixar iludir por falsas promessas destes dois lados aparentemente antagônicos. As eleições de 2018 oferecem outras opções que vão além da maniqueísta escolha entre o fascismo de Bolsonaro e o estelionato do PT.

Os candidato Ciro Gomes e Guilherme Boulos vêm apresentando propostas muito mais consistentes e viáveis e podem contribuir de forma muito mais decisiva para o país com projetos de desenvolvimento, retomada de empresas privatizadas e geração de empregos neste momento da nossa história.

Por sua experiência administrativa e conhecimento da vida pública, Ciro Gomes é certamente o candidato mais qualificado para exercer a Presidência da República. As pesquisas eleitorais parecem confirmar estes predicados porque Ciro – em todas as simulações – ganha por uma margem razoável dos seus adversários no segundo turno. Somente a obtusidade do PT e seu apego à doutrina do pensamento único impedem que esta vitória ocorra ainda no primeiro turno.

Se as pesquisas de preferência eleitoral estiverem corretas, elas indicam o fim de um ciclo de uma aparente democracia formal no Brasil e um futuro muito sombrio para o país, que não conseguiu resolver os problemas decorrentes de uma injusta distribuição de renda e corre hoje o risco de enfrentar até o crescimento de movimentos separatistas que terminarão por estraçalhar a pretendida e por um longo tempo mantida unidade nacional.

Para que esse processo viesse a ocorrer, contribuíram de forma decisiva as elites que dominam este país desde o seu nascimento e que hoje vem a público para pedir o apoio da população para resolver questões que em mais de dois séculos não puderam ou não de dispuseram a ao menos atenuar de forma consistente.

Os dois grupos em disputa baseiam seus projetos em falácias: um, porque pretende resolver as coisas por meio da violência, tortura, preconceitos raciais e castrações químicas, restrição à liberdade de informação, privatização de todas as empresas públicas, confisco de poupança, propostas que lembram um estado totalitário, e o outro porque se fundamenta na mentira das promessas não cumpridas, na demagogia do messianismo e culto à personalidade de um único líder carismático que se encontra na cadeia há vários meses.

O representante deste líder, seu poste – como é chamado o candidato Fernando Haddad – não dispõe de luz sequer para iluminar sua opaca personalidade, quanto menos para conduzir um país de quase 120 milhões de habitantes. Muitos já acreditam que – se Fernando Haddad chegar a ser eleito – somente permanecerá no poder caso se torne um títere das elites do país, uma espécie de Alexis Tsipras tupiniquim, com quem já possui algumas semelhanças, entre elas o hábito de que não usar gravata.

Aqueles que propõem hoje o voto útil cometem um grave erro: o PT de 2018 não é mais o PT de 1989, que carregava as esperanças de milhões de brasileiros – num tempo em que Brizola também encarnava as mesmas aspirações. O PT de hoje é uma farsa, uma agremiação política que fracassou em seu propósito de mudar o Brasil, se é que verdadeiramente tenha algum dia alimentado este propósito. Seu legado talvez venha a ser muito mais sombrio do que pretendem seus militantes e alguns antigos blogs chapa branca dos tempos de Lula e Dilma. Não dispõe, no entanto, de nenhuma respeitabilidade que lhe garanta que pode pedir e muito menos exigir que qualquer um que não reze pela sua cartilha dê um cheque em branco a quem traiu seus eleitores e se associou a bandidos.

 

Sérvulo Siqueira